As doenças tropicais continuam sendo um desafio significativo para a saúde pública, sobretudo em regiões onde fatores ambientais, biológicos e sociais favorecem a circulação de parasitas e seus vetores. Entre elas, a leishmaniose e a filariose representam exemplos marcantes de infecções transmitidas por artrópodes e associadas a situações de vulnerabilidade socioambiental. Esse é um tema de importância para o ENEM. A seguir a resolução, detalhada e didática, de questão ENEM sobre esse tema.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde, a filariose e a leishmaniose são consideradas doenças tropicais infecciosas e constituem uma preocupação para a saúde pública por ser alto o índice de mortalidade a elas associado.
Uma medida profilática comum a essas duas doenças é o(a)
A) incineração do lixo orgânico.
B) construção de rede de esgoto.
C) uso de vermífugo pela população.
D) controle das populações dos vetores.
E) consumo de carnes vermelhas bem cozidas.
Doenças tropicais são aquelas que ocorrem principalmente em regiões de clima tropical e subtropical como América Latina, África, Ásia e Oceania.
Variados fatores favorecem a prevalência dessas enfermidades nessas regiões: alta temperatura, umidade, abundância de vetores (mosquitos, carrapatos etc.), bem como as condições socioeconômicas precárias (pobreza, deficiência de saneamento básico, por exemplo).
Além disso, muitas dessas patologias são classificadas como Doenças Tropicais Negligenciadas pela Organização Mundial da Saúde, pelo fato de receberem menos atenção e investimentos em pesquisa para prevenção e tratamento.
Entre as diversas enfermidades tropicais, destacam-se a leishmaniose e a filariose, ambas causadas por parasitas e fortemente relacionadas à presença de vetores. A leishmaniose, transmitida pela picada do mosquito-palha (gênero Lutzomyia), manifesta-se em formas clínicas variadas e pode provocar graves lesões cutâneas ou acometimento visceral. Já a filariose, disseminada principalmente por mosquitos do gênero Culex, caracteriza-se pela obstrução do sistema linfático, levando a complicações como o linfedema crônico.
Essas doenças ilustram bem como fatores ambientais e sociais influenciam a dinâmica das infecções tropicais, demonstrando a necessidade de estratégias específicas de controle e prevenção.
LEISHMANIOSES
As leishmanioses são doenças infecciosas causadas por protozoários flagelados do gênero Leishmania, transmitidas pela picada de mosquitos-palha infectados. No Brasil, as principais formas são a Leishmaniose Tegumentar Americana (LTA) e a Leishmaniose Visceral (Calazar), que diferem quanto ao agente etiológico e manifestações clínicas.
Agentes etiológicos das Leishmanioses
A Leishmaniose Tegumentar Americana (LTA) no Brasil é causada por diferentes espécies do gênero Leishmania, entre as quais se destacam Leishmania braziliensis, Leishmania amazonensis e Leishmania guyanensis. Essas espécies provocam infecções na pele e, em alguns casos, podem atingir mucosas, especialmente do nariz, da boca e da garganta. A Leishmaniose Visceral (Calazar) é causada por Leishmania infantum, denominação moderna que substituiu Leishmania chagasi, responsável pela infecção de órgãos internos como fígado, baço e medula óssea.
Vetor e Formas de Transmissão
As leishmanioses são transmitidas pelos mosquitos-palha, pertencentes ao gênero Lutzomyia. Esses insetos atuam como vetores, ou seja, organismos que transportam o protozoário Leishmania de um hospedeiro a outro.
A transmissão ocorre especificamente pelas fêmeas dos mosquitos-palha, que realizam o repasto sanguíneo, ou seja, a alimentação com sangue. Esse comportamento é necessário para fornecer nutrientes essenciais ao desenvolvimento dos ovos. Durante a alimentação, a fêmea inocula as promastigotas do parasita junto com sua saliva na pele do hospedeiro.
Embora a principal forma de transmissão seja pela picada do vetor, a doença também pode ser transmitida, de forma rara, da mãe para o filho durante a gestação (transmissão congênita) ou por meio da transfusão de sangue contaminado.
O nome popular “mosquito-palha” está relacionado à coloração clara e amarelada desses pequenos insetos, que lembra o tom da palha seca. Essa aparência se deve, em parte, à presença de finos pelos que recobrem o corpo e as asas.
Além disso, os mosquitos-palha possuem asas estreitas e pouco eficientes, o que lhes confere um voo fraco, caracterizado por deslocamentos curtos, de baixa altura e sem grande controle direcional.
Apesar do nome, esses insetos não pertencem à mesma família dos mosquitos comuns, como o Aedes aegypti e o Culex quinquefasciatus, pertencentes à família Culicidae. O mosquito-palha integra a subfamília Phlebotominae.

Fonte: (2009) PLoS Pathogens Issue Image | Vol. 5(8) August 2009. PLoS Pathog 5(8): ev05.i08. https://doi.org/10.1371/image.ppat.v05.i08
Manifestações Clínicas das Leishmanioses
As manifestações clínicas das leishmanioses variam de acordo com o tipo de infecção e o sistema afetado. Algumas formas acometem a pele e as mucosas, enquanto outras atingem órgãos internos, provocando quadros mais graves.
Leishmaniose Tegumentar Americana (LTA)
A LTA compromete principalmente a pele e, em alguns casos, as mucosas do nariz, da boca e da garganta. A forma mais comum se manifesta como uma ou mais feridas na pele, que geralmente começam como pequenas pápulas (elevações endurecidas) e evoluem para úlceras de bordas elevadas e fundo avermelhado ou granuloso. Essas lesões podem ser indolores, mas podem persistir por meses ou anos se não tratadas.
Em casos mais graves, o parasita atinge as mucosas, provocando a destruição progressiva das estruturas do nariz e da boca, com consequentes deformidades severas, bem como prejuízos nas funções respiratórias e alimentares.

Leishmaniose Visceral (Calazar)
O Calazar é a forma mais grave da leishmaniose, caracterizada por infecção sistêmica que afeta órgãos internos como o fígado, o baço e a medula óssea. Os sintomas iniciais são geralmente inespecíficos, como febre prolongada, perda de peso, cansaço extremo e anemia. À medida que a doença progride, ocorre aumento do fígado e do baço (hepatosplenomegalia) e enfraquecimento do sistema imunológico, o que pode levar a infecções secundárias graves. Sem tratamento adequado, o Calazar pode evoluir para formas fatais.
Os cães são os principais reservatórios urbanos do Calazar no Brasil. Em cães infectados, a doença pode apresentar uma grande variedade de sinais, que incluem perda de peso progressiva, crescimento anormal das unhas (onicogrifose), feridas na pele, queda de pelos, apatia e aumento dos linfonodos (gânglios). Em estágios avançados, pode haver insuficiência dos rins. Muitos cães podem se manter infectados sem apresentar sinais clínicos evidentes, dificultando o controle da transmissão para os humanos.
Formas Evolutivas de Leishmania
Ao longo de seu ciclo reprodutivo Leishmania exibe duas formas evolutivas: promastigota e amastigota.
Promastigota
Esta é a forma extracelular encontrada no tubo digestivo do vetor, o mosquito-palha (Lutzomyia). Promastigota possui corpo alongado, um núcleo central e um flagelo livre na extremidade anterior, responsável pela locomoção. Próximo à base do flagelo localiza-se o cinetoplasto, uma organela especializada rica em DNA mitocondrial. O cinetoplasto é essencial para a produção de energia e para o processamento do RNA mitocondrial, desempenhando funções vitais para a sobrevivência do parasita. A forma promastigota se multiplica no vetor, sendo inoculada no hospedeiro vertebrado durante a picada.
Amastigota
Esta é a forma intracelular presente nos hospedeiros vertebrados, como humanos e outros mamíferos. A amastigota apresenta formato arredondado ou oval, não possui flagelo livre e se aloja no interior de macrófagos, células do sistema imunológico. Mesmo dentro das células do hospedeiro, o parasita mantém o cinetoplasto próximo ao núcleo, sustentando suas funções metabólicas e genéticas essenciais. Nessa fase, a amastigota se multiplica por divisão binária (reprodução assexuada), disseminando a infecção nos tecidos.
Ciclo Evolutivo de Leishmania
O ciclo evolutivo da Leishmania envolve dois hospedeiros: um vertebrado (como humanos ou cães) e um invertebrado vetor, o mosquito-palha do gênero Lutzomyia.
O ciclo começa quando a fêmea do mosquito-palha, que se alimenta de sangue para o desenvolvimento de seus ovos, pica um hospedeiro vertebrado e inocula na pele promastigotas, a forma flagelada do parasita. Após a inoculação, as promastigotas são rapidamente fagocitadas pelas células de defesa do hospedeiro, principalmente os macrófagos. No interior dessas células, os parasitas transformam-se em amastigotas, uma forma arredondada e sem flagelo livre.
As amastigotas se multiplicam por divisão binária, levando ao rompimento dos macrófagos e à liberação de novos parasitas, que passam a invadir outras células vizinhas. Esse processo de infecção e destruição celular provoca a reação inflamatória local que origina as lesões típicas da leishmaniose, como úlceras na pele ou, em casos mais graves, comprometimento das mucosas ou de órgãos internos.
Quando outra fêmea de mosquito-palha pica um hospedeiro infectado, ela ingere macrófagos contendo amastigotas. No intestino do vetor, as amastigotas se transformam novamente em promastigotas, que se multiplicam e se organizam no aparelho bucal do inseto. Assim, ficam prontas para serem transmitidas a um novo hospedeiro, completando o ciclo.
Medidas Profiláticas
A prevenção das leishmanioses envolve medidas que incluem o controle de vetores (“mosquitos-palha”) e de reservatórios (cães), educação sanitária e a proteção individual.
Controle de Vetores
O controle do mosquito-palha, vetor da leishmaniose, exige medidas específicas que diferem daquelas usadas para o combate ao mosquito da dengue. Como o mosquito-palha se desenvolve em matéria orgânica no solo e não em água parada, a eliminação de criadouros aquáticos não é eficaz contra ele.
As ações recomendadas incluem a aplicação de inseticidas residuais em paredes, muros e abrigos de animais, locais onde os insetos costumam repousar. Também é importante instalar telas de malha fina em portas e janelas para impedir a entrada dos vetores nas residências. O uso de mosquiteiros impregnados com inseticidas e a aplicação de repelentes nas áreas expostas da pele, especialmente ao entardecer e à noite, são medidas adicionais de proteção individual que ajudam a reduzir o risco de infecção.
Controle de Reservatórios
O controle de reservatórios da Leishmaniose Visceral, especialmente no meio urbano, envolve a realização de testagens sorológicas em cães, que são reconhecidos como importantes reservatórios dessa enfermidade. A partir da identificação dos animais infectados, seguem-se as orientações das autoridades de saúde pública, que podem incluir medidas como tratamento, isolamento ou, em alguns casos, a eutanásia dos cães, conforme as políticas locais estabelecidas. Além disso, a promoção do uso de coleiras impregnadas com inseticidas em cães é uma estratégia recomendada para prevenir novas infecções, atuando como uma importante barreira individual contra o vetor da doença.
Educação Sanitária
A educação sanitária é fundamental para a prevenção das leishmanioses. As campanhas educativas devem orientar a população sobre as formas de transmissão da doença e a importância do controle ambiental, com a manutenção de quintais limpos e a remoção de matéria orgânica em decomposição, que serve de criadouro para as larvas dos vetores. Também devem enfatizar a necessidade de proteger animais domésticos e pessoas que vivem em áreas de risco, além de incentivar a procura por atendimento médico diante de sinais suspeitos da doença.
As medidas de proteção individual contra a transmissão da Leishmaniose incluem o uso de roupas de mangas longas e calças, com o objetivo de reduzir a exposição às picadas dos mosquitos-palha, especialmente durante o entardecer e a noite, períodos de maior atividade desses vetores. Recomenda-se também a preferência por atividades realizadas em ambientes internos nesses horários críticos. Como complemento às barreiras físicas, a instalação de mosquiteiros e a aplicação de repelentes sobre a pele e as roupas são estratégias adicionais eficazes para aumentar a proteção pessoal contra a infecção.
FILARIOSE
A filariose linfática, também conhecida como elefantíase, é uma infecção parasitária que afeta principalmente o sistema linfático. Causada por vermes nematoides transmitidos por mosquitos, essa doença pode evoluir para quadros de inflamação crônica e acúmulo de líquidos, resultando em graves deformidades.
Agente Etiológico da Filariose
A filariose linfática no Brasil é causada pelo verme nematoide Wuchereria bancrofti, um parasita nematoide que se aloja nos vasos linfáticos humanos. Esses vermes adultos provocam inflamação e obstrução dos vasos, levando às alterações que caracterizam a doença, como o inchaço e o espessamento dos tecidos afetados.
Vetores e Formas de Transmissão
No Brasil, a filariose linfática é transmitida pelo mosquito Culex quinquefasciatus. Esse vetor é mais ativo no início da noite e durante a madrugada, o que coincide com o período em que as microfilárias estão em maior concentração na circulação sanguínea periférica.

Fonte: http://www.cdc.gov
A transmissão ocorre quando a fêmea do mosquito, durante o repasto sanguíneo, ingere microfilárias presentes no sangue de uma pessoa infectada. No interior do vetor, essas formas larvais se desenvolvem até atingir o estágio infectante. Quando o mosquito infectado pica outra pessoa, as larvas são inoculadas na pele e migram para os vasos linfáticos, iniciando a infecção no novo hospedeiro.
Manifestações Clínicas da Filariose
A infecção pela filariose pode evoluir em três fases distintas, dependendo do tempo de infecção e da resposta do sistema linfático do hospedeiro.
Durante a fase inicial da infecção, muitas pessoas abrigam microfilárias no sangue sem apresentar sinais clínicos evidentes. Essa condição é denominada fase assintomática e, embora os sintomas não estejam presentes, o parasita já pode causar danos progressivos ao sistema linfático.
A fase aguda é caracterizada por inflamação dos vasos e dos linfonodos, quadro conhecido como linfangite e linfadenite. Nessa fase, o paciente pode apresentar febre, dor, inchaço localizado e calor nas áreas afetadas, como pernas, braços ou região genital.
Com o passar do tempo, sem tratamento adequado, a doença pode evoluir para a fase crônica, marcada pela obstrução persistente dos vasos linfáticos. Essa obstrução leva ao acúmulo de líquido (linfedema) e ao espessamento dos tecidos, causando a elefantíase — um inchaço exagerado e deformante que acomete principalmente as pernas, escroto, mamas ou braços. As alterações crônicas podem ser irreversíveis, comprometendo a mobilidade e a qualidade de vida dos pacientes.
Formas Evolutivas de Wuchereria bancrofti
Durante o ciclo biológico da filariose, Wuchereria bancrofti apresenta duas formas principais no organismo humano. Os vermes adultos se instalam nos vasos linfáticos, onde se reproduzem sexuadamente e liberam microfilárias na circulação sanguínea.
As microfilárias são formas larvais, de tamanho microscópico, que circulam principalmente no sangue periférico durante a noite, fenômeno conhecido como periodicidade noturna. Essa adaptação aumenta as chances de serem ingeridas pelos mosquitos vetores, que também apresentam maior atividade nesse período.
A periodicidade noturna das microfilárias tem grande importância para o diagnóstico da doença, pois a coleta de sangue para exames deve ser realizada preferencialmente à noite, quando a concentração dessas formas no sangue periférico é mais elevada.
Ciclo Evolutivo de Wuchereria bancrofti
O ciclo de Wuchereria bancrofit inicia-se quando o mosquito vetor pica uma pessoa infectada e ingere microfilárias presentes na circulação sanguínea. No interior do mosquito, essas microfilárias migram para os músculos torácicos, onde se desenvolvem, passando por vários estágios até atingirem a fase infectante, conhecida como larva L3.
Durante um novo repasto sanguíneo, o mosquito infectado inocula essas larvas na pele de outro hospedeiro humano. As larvas penetram no organismo e migram para o sistema linfático, onde se transformam em vermes adultos. No interior dos vasos linfáticos, os vermes se reproduzem e liberam novas microfilárias na corrente sanguínea periférica, fechando o ciclo biológico do parasita.
Medidas Profiláticas
O controle de vetores é fundamental para reduzir a transmissão. Envolve a eliminação de criadouros de mosquitos, como água parada em áreas urbanas mal drenadas, o uso de inseticidas residuais em ambientes domésticos, a instalação de telas em portas e janelas e a utilização de mosquiteiros impregnados com inseticidas.
As medidas de proteção individual também são importantes, especialmente em regiões endêmicas. Recomenda-se o uso de repelentes nas áreas expostas da pele e de roupas que cubram braços e pernas, principalmente no período noturno, quando os mosquitos vetores são mais ativos.
Por fim, a educação em saúde desempenha um papel essencial. Campanhas informativas orientam a população sobre formas de prevenção, a importância da eliminação de criadouros de mosquitos e a necessidade de buscar diagnóstico e tratamento precoce, colaborando para o controle efetivo da filariose.
A filariose e a leishmaniose são doenças infecciosas causadas por parasitas e transmitidas por vetores artrópodes. Na filariose, o parasita Wuchereria bancrofti é transmitido pela picada de mosquitos, principalmente do gênero Culex, enquanto na leishmaniose o agente etiológico, protozoários do gênero Leishmania, é transmitido pela picada dos mosquitos-palha do gênero Lutzomyia.
Dessa forma, a profilaxia dessas doenças está diretamente relacionada ao controle das populações dos vetores, uma vez que a interrupção do ciclo de transmissão depende da redução do contato entre o vetor infectado e o hospedeiro humano.
Embora medidas como a melhoria do saneamento básico e o consumo adequado de alimentos sejam importantes para a saúde geral da população, essas ações não interferem diretamente na transmissão específica da filariose e da leishmaniose. Da mesma forma, o uso de vermífugos é voltado para parasitoses intestinais e não tem efeito sobre esses parasitas.
Portanto, a medida profilática comum e eficaz para ambas as doenças é o controle das populações dos vetores (alternativa D).
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